O recente escândalo de apostas ilegais na NBA, que resultou na prisão de mais de 30 pessoas, incluindo jogadores e treinadores, acendeu um sinal vermelho para todos os esportes profissionais. No ciclismo, embora nenhum caso comprovado de manipulação de resultados tenha sido documentado, especialistas alertam que o esporte pode estar mais vulnerável do que nunca a essa ameaça crescente. Com bilhões de dólares circulando no mercado de apostas online e tecnologias como os comunicadores de equipe facilitando potenciais fraudes, o ciclismo profissional enfrenta um desafio sem precedentes para manter sua credibilidade.
Índice do Conteúdo – Apostas Ilegais
O Escândalo da NBA: Um Alerta Para o Ciclismo
Em outubro de 2025, o mundo do esporte foi sacudido quando o FBI prendeu Terry Rozier, do Miami Heat, Chauncey Billups, treinador do Portland Trail Blazers, e outras 28 pessoas envolvidas em uma rede de apostas ilegais ligada à máfia. As investigações revelaram que “insiders compartilhavam informações confidenciais sobre jogos da NBA em troca de uma fatia dos lucros das apostas”, segundo o promotor Joseph Nocella.
O caso de Rozier é particularmente alarmante: antes de um jogo em março de 2023, ele teria informado associados que sairia da partida no primeiro quarto alegando uma lesão falsa. Resultado? Mais de 200 mil dólares foram apostados em suas estatísticas “under” (abaixo da expectativa), e ele deixou a quadra após apenas nove minutos de jogo. Para o ciclismo, esse episódio é um espelho preocupante do que poderia acontecer no pelotão profissional.
Por Que o Ciclismo É Tão Vulnerável
David Lappartient, presidente da UCI (União Ciclística Internacional), não esconde sua preocupação. Em declarações à imprensa belga, ele apontou os comunicadores de equipe como uma porta aberta para fraudes: “Tecnologicamente, não há nada que impeça alguém de ligar para o portador da camisa amarela durante uma etapa do Tour, certo?”
Essa vulnerabilidade se soma a outros fatores que tornam o ciclismo um alvo atraente para manipulações:
- Menor Escrutínio: Diferente da NBA ou do futebol europeu, o ciclismo opera fora dos holofotes principais do esporte mundial, o que significa menos vigilância e menos recursos para investigações.
- Mercado em Crescimento: Embora o ciclismo represente uma fração pequena das apostas esportivas globais de múltiplos bilhões de dólares, esse mercado está expandindo rapidamente com plataformas como DraftKings, Unibet e Bwin oferecendo apostas em etapas individuais, camisas de liderança e confrontos diretos.
- Histórico de Escândalos: O ciclismo já carrega o peso de décadas de doping sistêmico. Para um esporte que luta para reconstruir sua imagem, um escândalo de apostas seria devastador.
Quanto Dinheiro Está em Jogo?
Embora seja difícil precisar os números exatos, estimativas conservadoras sugerem que até 250 milhões de dólares poderiam estar circulando em apostas relacionadas ao ciclismo anualmente. O Tour de France e as clássicas monumentais como Paris-Roubaix são os eventos que atraem a maior movimentação financeira.
Sites de apostas online já oferecem odds para provas que acontecerão daqui a meses, com mercados que vão muito além do simples “quem vai vencer”. É possível apostar em qual ciclista vai abandonar primeiro, quantos quilômetros uma fuga vai durar, e até mesmo se haverá quedas em determinadas etapas. Essa diversificação de apostas multiplica as oportunidades para fraudes.
A Zona Cinzenta: Quando Acordos Entre Corredores se Tornam Manipulação
No ciclismo, acordos entre corredores são tão antigos quanto o próprio esporte. Tradicionalmente, ciclistas “compram” e “vendem” vitórias em estrada — uma prática que, embora éticamente questionável, faz parte da cultura do pelotão. Um corredor desesperado por uma vitória pode oferecer dinheiro em troca de que rivais não o ataquem na chegada.
O caso mais famoso envolve Alexandre Vinokourov e Alexandr Kolobnev na Liège-Bastogne-Liège de 2010. Emails revelados pela imprensa suíça sugeriram que Vinokourov teria pago 100 mil euros pela vitória, embora ambos tenham negado. O caso se arrastou nos tribunais por anos.
Mas onde traçar a linha? Profissionais do pelotão consultados pela Velo foram unânimes: “É impossível combinar o resultado de uma corrida com antecedência. Há peças demais em movimento”, disse um corredor que preferiu o anonimato. A natureza caótica das corridas — quedas, furos, condições climáticas, decisões táticas de múltiplas equipes — tornaria qualquer tentativa de manipulação extremamente arriscada.
O Que a UCI Está Fazendo Para Prevenir Fraudes
Surpreendentemente, a resposta é: muito pouco. Quando a Velo tentou contatar a UCI para comentar sobre políticas anti-apostas, não obteve resposta. Lappartient reconheceu que “a UCI não tem uma regra sequer em seus regulamentos sobre isso. Apostas não são permitidas, mas acontecem.”
Essa lacuna regulatória contrasta fortemente com outras organizações esportivas que implementaram:
- Programas de Integridade: A International Sports Integrity Partnership oferece frameworks para detecção e prevenção de manipulação de resultados
- Monitoramento de Apostas: Software sofisticado que detecta padrões suspeitos, como súbitas enxurradas de apostas em eventos obscuros
- Educação de Atletas: Programas obrigatórios sobre os riscos e consequências de envolvimento com apostas
O ciclismo precisa urgentemente adotar medidas similares antes que seja tarde demais.
Lições do Passado: Quando a Máfia Já Infiltrou o Ciclismo
Rumores sobre conexões entre máfia e resultados de corridas existem há décadas. Um dos casos mais notórios envolve Marco Pantani e o Giro d’Italia de 1999. Especulações sugerem que o italiano foi propositalmente flagrado com níveis elevados de hematócrito porque grupos criminosos perderiam milhões se ele vencesse a corrida Rosa. Embora nunca comprovadas, essas alegações ilustram quão profundamente o crime organizado pode penetrar no esporte.
A diferença agora é que as apostas online legalizadas criaram um mercado muito maior e mais acessível. Paradoxalmente, a legalização pode ser uma aliada na luta contra fraudes, já que mercados regulados são mais fáceis de monitorar do que redes clandestinas.
O Futuro: Apostas e Streaming Podem Salvar ou Destruir o Ciclismo
Plataformas de streaming integradas com apostas ao vivo representam uma oportunidade de monetização revolucionária para o ciclismo. Imagine assistir ao Tour de France enquanto aposta em tempo real sobre qual corredor vai atacar primeiro na subida seguinte. Esse modelo já funciona com sucesso em outros esportes e poderia gerar receitas substanciais para equipes e organizadores.
No entanto, essa integração também multiplica os pontos de vulnerabilidade. Quanto mais mercados de apostas existirem, mais oportunidades haverá para manipulação. A solução está em equilibrar inovação com vigilância rigorosa e transparência total.
O Que Precisa Acontecer Agora
Para evitar que o ciclismo siga o caminho da NBA, especialistas recomendam ações imediatas:
- Criar Regulamentos Específicos: A UCI precisa estabelecer regras claras sobre apostas, com penalidades severas para violações
- Monitoramento Tecnológico: Implementar sistemas de detecção de anomalias em apostas, similar ao que a SEC americana usa para detectar insider trading
- Fortalecer Sindicatos: Um sindicato de ciclistas mais robusto pode negociar acordos coletivos que incluam participação nos lucros de apostas legalizadas, reduzindo incentivos para fraude
- Transparência nos Comunicadores: Todas as comunicações rádio entre equipes e corredores deveriam ser gravadas e auditáveis
- Educação Continuada: Programas obrigatórios para todos os envolvidos no esporte sobre os riscos das apostas ilegais
A Hora de Agir é Agora
O ciclismo está em uma encruzilhada. De um lado, as apostas legalizadas representam uma fonte potencial de receita que poderia transformar a economia do esporte. Do outro, a falta de regulamentação adequada deixa a porta aberta para escândalos que poderiam destruir décadas de trabalho para reconstruir a credibilidade perdida com os casos de doping.
Como David Lappartient alertou: “Não queremos ter que nos livrar do buraco do doping no ciclismo apenas para enfrentar algo assim.” O escândalo da NBA serve como um aviso claro: nenhum esporte está imune à corrupção quando grandes quantias de dinheiro e oportunidades de lucro fácil estão em jogo.
A questão não é se o ciclismo será alvo de tentativas de manipulação por apostadores, mas quando. E a resposta do esporte a essas tentativas determinará se conseguirá preservar a autenticidade e a emoção que fazem milhões de fãs ao redor do mundo se apaixonarem por cada pedalada, cada ataque, cada vitória conquistada com suor e determinação nas estradas da Europa e do mundo.
O pelotão profissional precisa começar a trabalhar agora — antes que seja tarde demais e o ciclismo se torne manchete pelos motivos errados. A integridade do esporte depende disso.

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