No universo do ciclismo profissional, existem corridas que transcendem o tempo e se tornam verdadeiras lendas. Essas provas carregam décadas de história, tradição e emoção pura sobre duas rodas. São os chamados Monumentos do Ciclismo – cinco corridas de um dia que representam o maior desafio e prestígio para qualquer ciclista profissional no mundo.
O Que São os Monumentos do Ciclismo?
Os Monumentos do Ciclismo são as cinco corridas clássicas de um dia mais antigas, longas e prestigiadas do calendário mundial. Essas provas acontecem há mais de um século e conquistaram um status especial que só é comparável às três Grandes Voltas – Giro d’Italia, Tour de France e Vuelta a España.
Cada Monumento possui características únicas que o diferenciam: percursos desafiadores que atravessam paisagens icônicas, tradições centenárias que fazem parte da cultura local e um nível de competição tão intenso que muitos ciclistas dedicam toda uma temporada para vencer apenas uma dessas corridas.
Enquanto as Grandes Voltas dominam o calendário entre maio e setembro, os Monumentos acontecem principalmente na primavera e no outono, com quatro corridas concentradas nos meses de março e abril, e uma encerrando a temporada em outubro.
As Cinco Corridas Lendárias
As cinco provas que compõem os Monumentos do Ciclismo são:
- Milão-San Remo (Itália)
- Tour de Flandres (Bélgica)
- Paris-Roubaix (França)
- Liège-Bastogne-Liège (Bélgica)
- Il Lombardia (Itália)
Todas fazem parte do circuito UCI WorldTour, atraindo as melhores equipes e os principais atletas do planeta. Ciclistas como Wout van Aert, Mathieu van der Poel e Julian Alaphilippe são exemplos de atletas que direcionam suas temporadas especificamente para brilhar nessas corridas monumentais.
Milão-San Remo: A Primavera do Ciclismo
Conhecida carinhosamente como “La Primavera”, a Milão-San Remo abre a temporada dos Monumentos no final de março. Com impressionantes 299 quilômetros de extensão, é a corrida monumental mais longa e marca o despertar do ciclismo europeu após o inverno.
Realizada desde 1907, esta prova italiana atravessa as belas paisagens do norte da Itália, passando por colinas onduladas e a deslumbrante costa liguriana. O grande desafio da corrida está concentrado nos últimos quilômetros, com as temidas subidas da Cipressa e do Poggio.
Características da Milão-San Remo
- País: Itália
- Distância: 299 km
- Primeira edição: 1907
- Também conhecida como: La Primavera, A Clássica dos Sprinters
- Recordista de vitórias: Eddy Merckx (7 títulos)
O Poggio di Sanremo, localizado a apenas 6 km da chegada, é onde acontecem os ataques mais espetaculares. Essa subida curta mas intensa pode dividir o pelotão, deixando para trás ciclistas com pernas cansadas após quase 300 km de corrida. Se nenhum ataque for bem-sucedido, a prova termina em um emocionante sprint coletivo na Via Roma, em San Remo.
Tour de Flandres: A Joia da Bélgica
O Tour de Flandres (Ronde van Vlaanderen) é muito mais que uma corrida – é praticamente um feriado nacional na região de Flandres. Realizado no início de abril desde 1913, este Monumento de 263,7 km testa os limites físicos e técnicos dos ciclistas.
O “De Ronde”, como é carinhosamente chamado pelos belgas, é famoso por suas seções de paralelepípedos irregulares e pelas brutais subidas curtas conhecidas como “bergs” ou “hellingen”. Esses trechos de pedras antigas, muitas vezes molhados pela chuva típica da região, criam condições extremamente desafiadoras.
Características do Tour de Flandres
- País: Bélgica
- Distância: 263,7 km
- Primeira edição: 1913
- Também conhecido como: De Ronde, Ronde van Vlaanderen
- Recordistas de vitórias: Tom Boonen, Fabian Cancellara e outros (3 títulos cada)
As subidas icônicas como Koppenberg, Paterberg e Oude Kwaremont são decoradas com milhares de bandeiras flamengascom o leão amarelo, criando uma atmosfera única e emocionante. Essas subidas funcionam como uma corrida de eliminação natural, onde apenas os mais fortes sobrevivem até a linha de chegada em Oudenaarde.
Paris-Roubaix: O Inferno do Norte
Apelidada de “L’Enfer du Nord” (O Inferno do Norte), a Paris-Roubaix é a corrida mais brutal e romântica do ciclismo profissional. Realizada desde 1896, esta prova francesa de 257 km é famosa por seus desafiadores trechos de paralelepípedos que testam homem e máquina como nenhuma outra corrida.
A corrida inclui aproximadamente 55 km de paralelepípedos distribuídos em 29 setores classificados por dificuldade de uma a cinco estrelas. Esses “pavés” são muito mais irregulares que os paralelepípedos urbanos modernos, com pedras soltas, desniveladas e grandes lacunas que criam uma experiência extremamente exigente.
Características da Paris-Roubaix
- País: França
- Distância: 257 km
- Primeira edição: 1896
- Também conhecida como: Inferno do Norte, Rainha das Clássicas, La Pascale
- Recordistas de vitórias: Roger De Vlaeminck e Tom Boonen (4 títulos cada)
O setor mais famoso e temido é a Trouée d’Arenberg (Trincheira de Arenberg), que atravessa uma floresta com pedras extremamente irregulares. Quando chove, os paralelepípedos se tornam perigosamente escorregadios, aumentando o drama da corrida. O vencedor recebe tradicionalmente um troféu em forma de paralelepípedo no lendário Velódromo de Roubaix.
Liège-Bastogne-Liège: A Velha Senhora
A Liège-Bastogne-Liège é o Monumento mais antigo de todos, com origens que remontam a 1892. Apelidada de “La Doyenne” (A Velha Senhora), esta corrida belga de 258 km acontece na região das Ardenas e é conhecida por sua sucessão implacável de subidas.
Diferente das outras clássicas que favorecem especialistas em paralelepípedos ou sprinters, a Liège-Bastogne-Liège é a corrida dos escaladores. O percurso acumula um desnível total comparável a uma etapa de montanha do Tour de France, com cerca de 4.500 metros de escalada.
Características da Liège-Bastogne-Liège
- País: Bélgica
- Distância: 258 km
- Primeira edição: 1892
- Também conhecida como: La Doyenne (A Velha Senhora)
- Subidas icônicas: Côte de la Redoute, Côte de la Roche-aux-Faucons
A maioria das subidas está concentrada nos últimos 100 km, oferecendo uma série incessante de desafios. A Côte de la Redoute, localizada a cerca de 40 km da chegada, é conhecida por separar os mais fortes dos demais competidores. Após essa seleção natural nas montanhas, os sobreviventes descem em direção à antiga cidade industrial de Liège para o sprint final.
Il Lombardia: A Corrida das Folhas Caídas
O Giro di Lombardia (Il Lombardia) é o único Monumento de outono, encerrando a temporada de ciclismo de estrada em outubro. Conhecida poeticamente como “A Corrida das Folhas Caídas”, esta clássica italiana de 245 km oferece um espetáculo final com paisagens outonais deslumbrantes.
Realizada desde 1905, a corrida atravessa as colinas e lagos da Lombardia, no norte da Itália. Com suas subidas exigentes e descidas técnicas, este Monumento favorece escaladores completos que dominam tanto as subidas quanto as descidas.
Características do Il Lombardia
- País: Itália
- Distância: ~245 km
- Primeira edição: 1905
- Também conhecida como: A Corrida das Folhas Caídas
- Chegada: Alterna entre Bergamo e Como
O percurso inclui subidas emblemáticas como a Madonna del Ghisallo – um verdadeiro santuário do ciclismo – e o terrível Muro di Sormano, com rampas que chegam a 27% de inclinação. Os fervorosos tifosi italianos criam uma atmosfera vibrante que incentiva os ciclistas a fazerem movimentos decisivos nessas áreas críticas.
Por Que os Monumentos São Tão Especiais?
Os Monumentos do Ciclismo representam muito mais que simples corridas de bicicleta. Eles são patrimônios culturais que carregam mais de um século de história, tradição e emoção humana. Cada Monumento possui características únicas:
- Milão-San Remo: Testa a resistência absoluta com quase 300 km
- Tour de Flandres: Exige habilidade técnica nos paralelepípedos e bergs
- Paris-Roubaix: Desafia física e mentalmente no inferno dos pavés
- Liège-Bastogne-Liège: Premia os melhores escaladores
- Il Lombardia: Encerra a temporada com beleza e dificuldade
Para os fãs de ciclismo, estas são as corridas mais aguardadas do ano. A atmosfera única, com milhares de espectadores à beira das estradas, transforma cada Monumento em um verdadeiro festival popular. As rotas desafiadoras que passam por pontos icônicos e o entusiasmo contagiante da multidão tornam essas corridas especiais para todos os envolvidos.
Grandes Nomes que Marcaram os Monumentos
Ao longo da história, vários ciclistas lendários conquistaram múltiplas vitórias nos Monumentos. Eddy Merckx, considerado por muitos o maior ciclista de todos os tempos, venceu impressionantes 19 Monumentos durante sua carreira, incluindo 7 Milão-San Remo.
Outros nomes históricos incluem Roger De Vlaeminck, que dominou a Paris-Roubaix com 4 vitórias, e Tom Boonen, que também conquistou 4 vezes o Inferno do Norte além de 3 títulos no Tour de Flandres. Mais recentemente, Fabian Cancellara se destacou como um dos maiores especialistas em clássicas da era moderna.
O Futuro dos Monumentos
Apesar de terem mais de um século de história, os Monumentos do Ciclismo continuam evoluindo e se adaptando aos tempos modernos. As organizações trabalham constantemente para melhorar a segurança, aumentar a visibilidade para os fãs e manter a essência histórica que torna cada corrida especial.
A nova geração de ciclistas, incluindo talentos como Mathieu van der Poel, Wout van Aert e Tadej Pogačar, já demonstra interesse em escrever seus próprios capítulos na história dessas corridas lendárias.
Os cinco Monumentos do Ciclismo representam o auge da conquista no ciclismo de estrada. Milão-San Remo, Tour de Flandres, Paris-Roubaix, Liège-Bastogne-Liège e Il Lombardia são muito mais que corridas – são tradições centenárias que definem carreiras e criam heróis.
Cada primavera e outono, o mundo do ciclismo se volta para essas provas icônicas, onde história, tradição e drama esportivo se encontram nas estradas da Europa. Para qualquer ciclista profissional, vencer um Monumento é alcançar a imortalidade no esporte que amam.
Se você é apaixonado por ciclismo, acompanhar os Monumentos é essencial para entender verdadeiramente a alma e a essência deste esporte magnífico. São corridas que emocionam, inspiram e nos lembram por que o ciclismo é um dos esportes mais belos e desafiadores do mundo.
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