Em uma escolha que surpreendeu o pelotão e mostrou que inovação pode vir dos lugares mais inesperados, o ciclista belga Toon Aerts conquistou o título do Campeonato Europeu de Cyclocross pilotando uma bicicleta de estrada adaptada. A vitória aconteceu no fim de semana e deixou claro que, quando se trata de performance, o equipamento certo nem sempre é o mais óbvio.
A Escolha Surpreendente pela Road Bike
Enquanto a maioria dos competidores opta por bikes específicas de cyclocross ou pelos híbridos gravel/cyclocross que dominam o cenário atual, Aerts tomou um caminho diferente. Ele escolheu adaptar a Orbea Orca OMX, uma bicicleta de estrada pura, para enfrentar os desafios técnicos de uma prova de cyclocross.
A decisão não foi por falta de opções. Como corredor patrocinado pela equipe Deschacht-Hens-Maes, Aerts tinha à disposição a Orbea Terra Race, modelo desenvolvido especificamente para corridas gravel e cyclocross. Mas o belga preferiu ir na contramão e adaptar uma máquina feita para o asfalto.
Os Números que Explicam a Estratégia
A escolha de Aerts não foi apenas por intuição – ela se baseia em vantagens técnicas concretas. A Orbea fornece dados que mostram o porquê dessa decisão fazer sentido para um competidor de elite:
- Peso do quadro: A Orca OMX tem quadro de apenas 750g, enquanto a Terra Race pesa 910g – uma economia de 160g que faz diferença real em uma prova onde você precisa carregar a bike
- Facilidade de transporte: Com apenas 6,7kg no total (na configuração road), a Orca é extremamente fácil de carregar sobre obstáculos no percurso de cyclocross
- Rigidez estrutural: O quadro mantém alta rigidez no tubo diagonal, stays traseiras e tubo de direção, características cruciais para aguentar a pedalada de baixa cadência e alto torque típica do cyclocross
Segundo a própria Orbea, essas características estruturais da Orca resistem à torção de forma ideal, exatamente o que se precisa nas arrancadas intensas e mudanças de ritmo constantes de uma corrida de cyclocross.
As Adaptações Necessárias para a Competição
Claro que uma bike de estrada não pode simplesmente entrar em uma prova de cyclocross sem modificações. Aerts e sua equipe fizeram ajustes estratégicos para tornar a Orca competitiva no terreno misto:
Garfo e Folga para Pneus
O principal desafio da Orca era a folga limitada para pneus mais largos. A bike originalmente aceita apenas pneus de 32mm, mas as regras da UCI para cyclocross permitem (e exigem) pneus de até 33mm de largura.
A solução? Trocar o garfo original pelo garfo da Terra Race, que oferece clearance de 45mm e rake de 55mm (contra os 43mm do garfo road). Essa mudança não só permitiu o uso de pneus mais largos como também trouxe maior estabilidade para o bike handling em terrenos irregulares.
Pneus Tubulares: A Escolha dos Profissionais
Aerts equipou sua Orca com pneus tubulares Dugast Pipistrello de 33mm, montados em rodas Icon T3.5 Disc de carbono. A marca Dugast, agora parte da Vittoria, continua sendo referência no cyclocross de elite.
Embora os Pipistrello estejam disponíveis também em versão tubeless, os tubulares seguem sendo preferidos no cyclocross profissional por motivos práticos: podem ser rodados com pressões ultra-baixas sem risco de perder ar, e caso furem durante a corrida, o ciclista consegue pedalar até o pit stop sem desmontar o pneu.
Transmissão e Cockpit
Apesar de usar uma bike de estrada, Aerts manteve componentes mais voltados para o cyclocross:
- Grupo: Shimano Dura-Ace Di2, o topo de linha da marca japonesa
- Pedivelas: Configuração 46/36t, uma relação favorita no cyclocross que oferece bom equilíbrio entre velocidade nas retas e força nas subidas técnicas
- Guidão: Apenas 40mm de largura, contrariando a tendência dos guidões largos do gravel. Aparentemente, a alavancagem extra prometida pelos guidões wide não é necessária para vencer no cyclocross
Uma Vitória Carregada de Emoção
A conquista do título europeu foi especialmente emotiva para Toon Aerts. “É uma corrida que já venci antes, há nove anos completos”, comentou o belga após cruzar a linha de chegada.

O longo intervalo entre as duas vitórias no Campeonato Europeu torna esse título ainda mais significativo na carreira do ciclista, provando que experiência e escolhas inteligentes de equipamento podem fazer toda a diferença em competições de alto nível.
O Que Isso Significa para o Futuro do Cyclocross
A vitória de Aerts com uma bike de estrada adaptada pode abrir precedente para novas experimentações no cyclocross profissional. Enquanto os fabricantes investem cada vez mais em bikes específicas para a modalidade e em híbridos gravel/cyclocross, um campeão europeu mostrou que às vezes vale a pena pensar fora da caixa.
Para ciclistas amadores e profissionais, a mensagem é clara: conhecer seu equipamento e fazer adaptações inteligentes pode ser mais eficaz do que simplesmente seguir as tendências do mercado. O peso reduzido, a rigidez adequada e os ajustes corretos fizeram da Orca OMX a arma perfeita para Aerts naquele dia.
A escolha ousada de Toon Aerts em usar uma bicicleta de estrada no Campeonato Europeu de Cyclocross não foi apenas uma jogada de marketing ou uma excentricidade – foi uma decisão técnica calculada que resultou em vitória no pódio.
Com 160 gramas a menos no quadro, rigidez otimizada e adaptações cirúrgicas no garfo e nos pneus, a Orbea Orca OMX provou que pode competir – e vencer – em terrenos para os quais não foi originalmente projetada.
Para quem acompanha o ciclismo mundial, esse é mais um capítulo fascinante que mostra como a inovação e o pensamento estratégico continuam moldando o esporte. E para os fãs de cyclocross, fica a certeza: às vezes, a melhor bike para a corrida não é aquela que está na prateleira com a etiqueta certa.
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